Titane [Crítica do Filme]

Como é bom ver um filme fora da caixinha nos dias de hoje e como é bom saber que o monopólio Hollywoodiano vem ruindo já que pouco se esforça pra se reinventar.

Quando a diretora Julia Ducournau estreou com Raw (2017), deu aquela chacoalhada no atualmente insípido (salvo raras exceções) cinema francês e parecia uma veterana em seu debut, mostrando uma segurança invejável e criando imagens poderosas. O reconhecimento de público e crítica foi imediato e a expectativa pelo que vinha a seguir foi grande. Surgiu então Titane, a emulação mais competente do body horror oitentista, onde o reinado se dividia entre David Cronenberg e David Lynch, seguidos de perto por… absolutamente ninguém – até que Julia Ducournau surgiu e ergueu a coroa de discípula mais fiel. O melhor de tudo é ver que um filme como Titane arrebatou a Palma de Ouro no Festival de Cannes, que em 74 edições nunca premiou um filme de horror e nunca premiou uma mulher sozinha – a neozelandesa Jane Campion dividiu em 1993 com o chinês Chen Kaige.

Para o pano de fundo dos personagens sofridos tentando preencher o trágico vazio de suas existências, Julia ousou ao coletar elementos de Crash – Estranhos Prazeres (1996), A Mosca (1986) e Videodrome (1983), todos do diretor David Cronenberg, assim como Brian De Palma fazia ao homenagear seu mestre Alfred Hitchcock. Não satisfeita, ainda inseriu referências do clássico O Bebê de Rosemary (1968) e do controverso Eraserhead (1977). Esse mix poderia resultar indigesto se não fosse o talento de Julia Ducournau atrás das câmeras e com roteiro próprio, extraindo uma quase improvável humanidade do bizarro casal de protagonistas: Alexia (Agathe Rousselle), uma dançarina que se torna serial killer e Vincent (Vincent Lindon) um bombeiro viciado em esteroides que adora dançar, mas sofre devido ao desaparecimento do único filho. Alexia vê uma chance de não responder pelos seus crimes ao se passar por Adrian, o filho de Vincent, e a colisão de ambas almas torturadas é inevitável.

Titane é a tradução francesa para titânio, metal leve e resistente que Alexia carrega no crânio após um acidente de carro na infância. O emprego de dançarina que interage com automóveis parece uma consequência natural dos eventos anteriores de sua vida. Após ser assediada por um dos clientes que só podem observar as garotas sem poder tocá-las, Alexia surta e o rastro de sangue se inicia.

A modelo Agathe Rousselle, em sua estreia nos cinemas, parece vinda de uma carreira de no mínimo duas décadas, tamanha a sua competência. Ela empresta corpo, alma, mente, coração e ossos para dar vida a uma das personagens mais polêmicas da atualidade, protagonizando muitas cenas de nudez e mutilação totalmente inseridas na história. Vincent Lindon, em atuação corajosa, nem faz esforço para se conectar ao personagem. Suas cenas com Agathe comovem ao encher a tela de uma emoção implícita, que atenua o mar de bizarrices que a narrativa oferece.

Titane não economiza no peso das imagens, não poupa o expectador do choque (nunca gratuito), não recorre a disfarces e nem usa pitadas de humor como fazem os blockbuster de super-heróis só pra colorir a violência – Titane é simplesmente brutal.

Trailer

FICHA TÉCNICA

Título: Titane
Direção: Julia Ducournau
Roteiro: Julia Ducournau
Disponível no MUBI

Italo Morelli Jr.

One thought on “Titane [Crítica do Filme]

  • 26 de fevereiro de 2022 em 03:12
    Permalink

    Olá,
    Ótima crítica.
    Adorei Raw, então espero curtir esse também.
    Parece ter elementos ainda mais atrativos e para o meu interesse – muito creepy esse comentário sim. haha

    até mais,
    Canto Cultzíneo

    Resposta

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