Seguindo a mesma tradição dos dramas familiares que tiveram seu auge com Kramer VS Kramer (1979), Gente como a Gente (1980) e Laços de Ternura (1983), Era uma vez um Sonho (ou Elegia Caipira no original) parece ter saído diretamente dos anos 80 para o século XXI, tamanha a sua semelhança com um tipo de cinema raro de se ver atualmente.
Ron Howard comanda tudo com sua habitual competência ao contar a história real de J.D. (interpretado pelo talentoso Owen Asztalos na adolescência e por Gabriel Basso quando adulto) um ex fuzileiro naval e estudante de Direito em Yale que, prestes a conseguir o emprego dos sonhos, é interrompido por uma crise familiar que o obriga a retornar para a cidade onde nasceu e ajudar a irmã Lindsay (Hayley Bennet, muito bem aqui) a buscar tratamento para a mãe adicta Bev (Amy Adams, em grande momento) que acaba de sofrer uma overdose de heroína. Com uma tocante trajetória de superação, J.D. é grato pela ajuda que recebeu da avó materna (Glenn Close, fantástica) a quem ele chamava carinhosamente de Mamaw (mamãe em caipirês) e que ajudou a criá-lo. É na figura forte de Mamaw que gravitam todos os personagens da família, num roteiro simples e ao mesmo tempo cheio de diálogos e frases marcantes. Mamaw engravidou aos 13 anos e não tem chances na vida de sair daquela cidade do interior e sempre lutou para que seus descendentes pudessem melhorar de vida – não conseguiu com Bev, mas está disposta a conseguir com J.D.
O vai e vem no tempo em nenhum momento confunde o expectador, num ótimo trabalho de edição de imagens que faz uso inteligente dos flashbscks sem travar a narrativa. Ponto também para o diretor Ron Howard, que consegue extrair interpretações brilhantes de todo o elenco. Versátil, Howard dirigiu a comédia romântica Splash – Uma Sereia em Minha Vida (1984), a comédia de ficção científica Coccon (1985), a fantasia Willow (1988), a comédia O Tiro que não saiu pela Culatra (1989), o drama de ação Backdraft – Cortina de Fogo (1991), o épico Um Sonho Distante (1992), o drama de ficção científica Apollo 13 (1995), o natalino O Grinch (2000) o drama Uma Mente Brilhante (2001) que lhe valeu o Oscar de Direção e as adaptações dos best sellers do escritor Dan Brown, O Código da Vinci (2006), Anjos e Demônios (2009) e Inferno (2016). Ninguém melhor do que ele pra comandar história tão universal e nos lembrar que Hollywood ainda pode fazer bom cinema.
Amy Adams tem em mãos mais uma personagem complexa, trágica e acima de tudo humana. Ela vai de um extremo a outro com precisão cirúrgica, dosando bem as explosões de fúria com cenas mais dramáticas. É impossível não se comover com sua situação e impossível imaginá-la fora da corrida do Oscar. Se for indicada, esta será sua sétima indicação sem vitórias. Merecia ter ganho pelo menos em duas ocasiões: em O Lutador (2010) e em Vice (2018). Sua vitória agora compensaria também o fato de nem sequer ter sido indicada pelo icônico A Chegada (2016), um dos maiores papéis femininos dos últimos tempos.
O mesmo vale para Glenn Close. Com uma sólida carreira no teatro, TV e cinema, Glenn foi indicada sete vezes e nunca venceu. Perdeu para a cantora Cher quando protagonizou Atração Fatal (1987) e para Jodie Foster no ano seguinte com sua interpretação definitiva da Marquesa de Merteuil em Ligações Perigosas (1988). Sua derrota para Olivia Colman foi uma surpresa para todos, inclusive para a própria Olivia que, visivelmente nervosa, fez o discurso mais divertido da história da premiação. No papel de uma das avós mais legais que o cinema já retratou, Glenn está fielmente caracterizada como mostram os vídeos caseiros nos créditos finais. Além da maquiagem, cabelos e figurinos idênticos a verdadeira Mamaw, ela empresta olhar, corpo, alma e ossos a mais uma antológica personagem em sua carreira.
No livro autobiográfico, a figura central é o próprio J.D., como não poderia deixar de ser, enquanto aqui as personagens femininas assumem o protagonismo devido dimensão de ambas e as atuações irretocáveis das atrizes.
Um dos melhores filmes de 2020.
Trailer
FICHA TÉCNICA
Título: Era uma vez um sonho
Título Original: Hillbilly Elegy
Direção: Ron Howard
Data de lançamento no Brasil: 24 de novembro de 2020
Netflix
Italo Morelli Jr.
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Oi Italo, tudo bem?
Eu vi o filme e fiquei impressionada com a atuação de todos eles. Concordo com você, ambas merecem muito ganhar o Oscar. Essa é uma história com drama familiar forte, difícil não sair tocada por eles. Adorei sua crítica.
beijinhos.
cila.
https://cantinhoparaleitura.blogspot.com/
Olá, Italo.
Apesar do elenco de peso, e são atrizes que gosto muito, o filme não é bem o estilo que gosto de assistir. Por isso vou deixar passar a dica.
Prefácio
Socorro que nem vi que esse filme estreou. Parece ser bem denso mas quero conferir justamente por causa das duas atrizes. Coitada da Amy, que só é indicada mas não ganha...
Beijos
Balaio de Babados
Olá,
Eu adoro o cinema do Ron, e principalmente esse lado mais sensível
Elenco feminino incrível que venero demais, e certamente não deixarei passar.
até mais,
Canto Cultzíneo
Oi Ítalo
Eu já ouvi falar desse filme mas ainda não pude assistir, se bem que não é bem o meu estilo de filme já que é um drama daqueles. Eu amo demais a atuação da Amy, acho ela uma ótima atriz e estou torcendo para ela conseguir ser indicada ao Óscar desse ano. Espero poder assistir futuramente a obra.
Beijo
http://www.capitulotreze.com.br/?m=1
O enredo parece surpreendente. Não sabia que havia um livro e gostei que o as personagens femininas empoderam o filme ganhando protagonismo. Não é o meu tipo de filme, mas olha que estou curiosa.
Abraço
Imersão Literária
Parabéns pela resenha muito bem escrita. O figurino e a maquiagem são de cair o queixo.
Bom fim de semana!
Jovem Jornalista
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Até mais, Emerson Garcia