As Flores do mal [Resenha Literária]

Suspeito que fora do país Baudelaire seja mais acenado com respeito do que realmente lido. É uma pena, porque se poderia dizer que ele foi o primeiro poeta moderno, alguns autores diziam que ele era “o maior exemplo da poesia moderna em qualquer idioma.”
É tanto uma questão de estado de espírito quanto qualquer outra coisa. Baudelaire foi dado ao devaneio e ao desespero em partes mais ou menos iguais. Ele estava muito consciente da maneira como sua mente estava em outro lugar, inadequada à existência cotidiana. A ideia do poeta que é desdenhoso ou aterrorizado com a vida cotidiana começa ali.
Essa famosa sequência foi publicada pela primeira vez na França em 1857 e foi rapidamente condenada pelas autoridades como uma ofensa à moralidade pública, o que não prejudicou a reputação do poeta. No segundo poema, ele compara o poeta – isto é, ele próprio – a um albatroz, capturado por marinheiros zombadores e retirado de seu elemento natural: “exilado no chão entre chistes vulgares, / as asas de gigante impedem-no de andar”.
Essa é a tradução dada aqui, por Mário Laranjeira; e agora você tem muito menos desculpa para não ler Baudelaire do que antes, pois essa tradução não apenas é uma das melhores traduções para o português, bem como a obra nos presenteia com os poemas que foram condenados naquela época.
Traduzir Baudelaire é provavelmente muito difícil. Você não precisa apenas manter o máximo possível as formas originais dos versos – e Baudelaire era um mestre delas, brincando com as estruturas clássicas do verso francês, tornando-o preciso e fluido ao mesmo tempo – você precisa tentar trazer essa obra para o presente para obter nuances no vocabulário.
Eu não estou dizendo isso para diminuir qualquer coisa, longe de mim, estou apenas ilustrando as dificuldades de traduzi-lo. Temos também na obra um ensaio útil sobre a vida dele, notas úteis e milhares de poemas. Acho que essa é a melhor maneira de entrar no mundo onírico do poeta, produzindo, como diz o título, beleza do mundo sórdido ao seu redor.

As Flores do Mal é uma obra-prima da literatura francesa que deve ter um lugar de destaque em qualquer estante de livros que vale o seu nome, pois de fato, a beleza do mal, com o seu aroma mefítico e tão sedutor, é exatamente do que trata este livro. É uma coleção de poemas e elegias que refletem as visões de Baudelaire sobre nossa pobre condição humana decorrente principalmente de nossas vidas condenadas sobre as quais paira como em A espada de Dâmocles e a inevitabilidade da morte, enquanto continuamos enganando a nós mesmos, perseguindo a sempre evasiva busca de um mundo perfeito, uma existência perfeita e, ousamos dizer, imortalidade. A resposta de Baudelaire a essa nossa situação, por mais tentativa que seja, é o escapismo – escapismo puro, mas principalmente impuro.

Posso dizer com toda certeza que As Flores do Mal não é um livro para todos os leitores, e que se você estiver procurando por uma leitura para colocar um sorriso em seu rosto, pode procurar em outro lugar. É justo dizer que, com sua poesia magistral, Baudelaire perfura não apenas nosso coração, mas nossa alma.

Suas palavras nos desnuda completamente e nos vemos pelo que realmente somos – apenas seres humanos vivendo nossas vidas. E que, quando pensamos nisso, não é tão ruim. Ou seja, desde que continuemos lembrando de colocar em prática esta pequena citação de outro mestre de seu gênero: “Tudo o que precisamos decidir é o que fazer com o tempo que nos é dado” (Gandalf). E, de fato, não importa quanto tempo vivemos, mas quão bem vivemos. Na verdade, As Flores do Mal me ensinou isso. Ah, e O Senhor dos Anéis também, é claro!
FICHA TÉCNICA
Título: As Flores do Mal
Autor: Charles Baudelaire
Nota: 5/5
Onde Comprar: Amazon

Natália Silva

Na Nossa Estante

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