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Para toda a eternidade [Resenha Literária]

Eu não sabia o que era a morte, até meu pai morrer. Aprendi sobre caixão, velórios e principalmente sobre o luto, descobri que era doloroso falar sobre o tema, mais do que isso, descobri o tabu da morte. As pessoas desviam do tema com medo de nos magoar, mas também com medo de atrair algo ruim para si, a morte ainda é algo sinistro para todos nós, um trauma, um ritual que evoca sensações desagradáveis e sombrias. Bom, não em todos os lugares do mundo.

Para toda a eternidade de Caitlin Doughty nos mostra a importância de um luto saudável, da necessidade de pessoas vivas encontrarem também a paz na morte, sem tabu, sem medo alimentado pela indústria que usa nossos receios para ganhar dinheiro. Segundo a autora, estamos matando a morte, empurrando-a para um lugar de escanteio na sociedade quando deveria ser encarado como algo que faz parte da vida. E só posso concordar com Caitlin sobre a importância das despedidas, o funeral é realmente um evento de cura. Antes da morte do meu pai eu fugia de cemitérios, hoje vou a velórios porque entendo que a família precisa de apoio. E com o livro entendi que cada lugar tem a sua maneira de encarar a morte e passar por esse processo, pode parecer ser desrespeitoso para nós, mas é preciso respeitar as tradições de outras culturas.

A autora vai nos mostrando diferentes rituais fúnebres em vários lugares no mundo, acredito que deve ser lindo a sua maneira a cremação em Piras de Fogos em Crestone, bem mais do que a cremação que estamos acostumados. Pela descrição da autora, é um evento cheio de vida, com perdão pela ironia. Fiquei impactada com o turismo em Toraja onde se explora a morte de uma maneira bem diferente em que as pessoas vão até o lugar para ver crânios, cadáveres expostos, animais sendo sacrificados. Já no México houve uma época que o Halloween americano ameaçava a tradição local, mas o Día de los Muertos continuou sendo celebrado mostrando que os mexicanos encaram a morte com menos receio do que muitas outras culturas. Isso não quer dizer que não haja sofrimento, porque inevitavelmente há, mas o processo de cura coletiva envolve o sentimento de nunca abandonar a memória dos entes queridos.

Confesso que antes da leitura eu nunca tinha parado para pensar sobre compostagem (que acelera a decomposição do corpo) e achei interessante que quando termina a família pode usar a terra para jardinagem. Já passando pela Espanha descobri o significado do vidro nos caixões. Caitlin também dedica um longo capítulo ao Japão, onde a taxa de suicídio é alta, as cremações também. E também gostei de ver a relação da tecnologia com o Budismo. Na Bolívia conheci as Ñatitas e seus crânios e na Califórnia fiquei impressionada com o estado do corpo da Sra. Sherpard.

Para toda a eternidade foi uma aula sobre rituais, sobre a importância de ajudar as famílias no momento que perdem um ente querido, que cada país tem seu jeito de lidar com a morte e que não devemos julgá-los. Aprendi que todos nós levamos um tempo para as despedidas, que os hospitais na pressa de liberem suas salas podem não respeitar esse tempo, as funerárias estão mais procuradas em vender caixão a todo custo e que é preciso resgatar nossos rituais, sem vergonha e sem medo. Em suma, foi uma leitura enriquecedora pra mim.
FICHA TÉCNICA
Título: Para toda a eternidade
Autora: Caitlin Doughty
Nota: 5/5
Onde Comprar: Amazon e Loja DarkSide® Books



Michele Lima

Na Nossa Estante

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