Teresa de Manuel Bandeira [Devaneios]

Teresa

A primeira vez que vi Teresa 
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.
Ah a poesia! Quando adolescente eu adorava Mario Quintana, Carlos Drummond de Andrade, Álvares de Azevedo e Bandeira mais que todos os outros! Porém, quando adolescente eu nem me preocupava em analisar uma poesia, mas na faculdade de Letras eu tive que analisar tantas que é como se tivesse quebrado o encantamento em mim. Talvez isso seja normal quando se faz algo repetidas vezes. Acho que o trauma é tão grande que quando alguém me pede pra ler um poema de sua própria autoria eu tenho medo de ser tão crítica (e perder a amizade) que geralmente não falo nada!
No entanto, hoje eu vou só falar da minha paixão por “Teresa”, um dos meus poemas preferidos do Bandeira, que está no livro “Libertinagem” (1930), representando uma fase mais madura do poeta. Aliás, a poesia de Manuel Bandeira passa por três estágios: a primeira fase é de submissão ao sentido e à forma clássica (“A cinza das Horas”, “Carnaval e Ritmo Dissoluto”), a segunda fase é de libertação da forma e quase autonomia do sentido (“Libertinagem”) e a terceira, de superação de ambas as coisas, ou seja, de plenitude artística (“Lira dos Cinqüentanos”).
Em “Libertinagem” o poeta se desobriga de todas as regras convencionais para se fixar a um rumo pessoal e revolucionário. Dentro do possível, era capaz de chegar até onde podia ir com a linguagem. Estava preparado para ser livre e dizem que quando o Modernismo cruzou seu caminho, de alguma maneira, ele já estava preparado para recebê-lo.
Agora vamos ao poema! “Teresa” não esconde muitas coisas, já que não precisa ficar analisando muito pra entender que existem três fases da mulher descrita: a primeira visão é de uma garota que para ele possuía pernas estúpidas e uma cara que parecia uma perna. A palavra perna aparece duas vezes nessa estrofe, indicando, embora um pouco sutil, uma visão um pouco erótica, pois se enxerga logo de início a perna da figura feminina. A segunda fase mostra o amadurecimento de Teresa, pois os olhos eram mais velhos que o resto do corpo. Mais uma vez a figura é descrita principalmente por uma parte de seu corpo, os olhos, sendo esta a fase em que a menina começa a sofrer transformações. A terceira e última fase é de completa maturação e mostra que a visão do poeta já havia mudado. Há, inclusive, uma insinuação de uma relação mais íntima, já que os céus se misturaram com a terra, uma união entre o sujeito e o objeto.
Eu adoro “Teresa” pelo expressionismo e o erotismo que existe nele. Além do que o poema é quase uma prosa, como se o autor contasse um caso corriqueiro! Eu diria que “Teresa” representa as imagens da poesia de Bandeira, capaz de reter na memória as imagens da infância, em que o leitor é convidado a participar de um testemunho. Bandeira parece sempre estar se dirigindo a um cúmplice, como se eu fosse uma amiga que ele conta seus casos, acho que é por isso que ele se tornou meu poeta preferido.
Michele Lima
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Interrompemos a programação normal para um aviso da Jaci!

Gente, sei que nos últimos dias ocorreram várias mudanças no layout do blog e pode parecer que as administradoras estão surtadas… Bem, talvez eu seja mesmo surtada… kkk mas é que nós estamos em busca do lay perfeito e confessamos: “Está sendo tão difícil!!!”.

Espero que os lays não estejam atrapalhando a leitura de ninguém, estamos preservando o fundo branco do texto toda vida e buscando uma identidade visual que abarque a diversidade dos temas abordados aqui .


Mas, mesmo em dias de reforma, esperamos que vocês continuem se sentindo bem recebidos em nossa casa para sentarem conosco tomarem um café, um licor, um suco ou um chá enquanto conversamos sobre tudo e todos!


Cheros, Jaci.

7 thoughts on “Teresa de Manuel Bandeira [Devaneios]

  • 21 de março de 2014 em 14:00
    Permalink

    Tem uma coisa que amei nesse post, me fez olhar o poema com outros olhos. Eu nunca aprendi a "ler" poemas assim como vc fez. Leio e sinto só. E vou confessar que as vezes não me dizem nada, só um emaranhados de palavras e só…rsrs….
    Beijos
    Adriana

    Resposta
    • 21 de março de 2014 em 21:24
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      Que bom que gostou Adriana, mas eu tb confesso que tem poema por aí que não diz nada de interessante! rsrsrrss

      Bjs

      Resposta
  • 22 de março de 2014 em 11:22
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    tb adoro manuel bandeira. o layout entrou fácil, não está pesado. eu tb tenho mantido o fundo branco pq facilita a leitura independente do layout. beijos, pedrita

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  • 23 de março de 2014 em 12:13
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    O layout funcionou direitinho aqui, adorei essa poesia, bem legal :))

    Lara – whoisllara.com

    Resposta
  • 3 de julho de 2014 em 19:31
    Permalink

    Ainda no Recife, Bandeira passou óleo no corpo e os rótulos nunca pegaram…assim como a Europa, ele foi Moderno 10 antes dos Modernistas…já sentia os ares no frio de Clavadel e guardou para ele…ficou escondidinho em Petropolis e Teresopolis… pioneiro do Modernismo, deixou as pedradas e tomates para o Mario de Andrade! Belo livro o "Libertinagem", e tenho a felicidade de possui-lo em primeira edição, dedicado para Anita Malfatti…não dá para ficar mais Moderno do que isto!rsrsrsrs…Parabéns pelo Blog…Pedro

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    • 4 de julho de 2014 em 00:18
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      Obrigada Pedro!!

      Resposta
  • 13 de junho de 2018 em 19:27
    Permalink

    "Libertinagem" é de longe o melhor livro do Bardo…quando ele de fato liga o pisca-F… para toda métrica e formas…o livro é um estouro de capa a capa, sem contar com um "page lay-out" bem moderno para os padrões de 1930!

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