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5 álbuns para acompanhar gaúchos desgarrados

Eis-me sozinha em um kitnet em algum canto da imensa saudade de São Paulo em plena época de isolamento social. Se ainda outro dia eu estranhava o fato de não ouvir mais os inúmeros álbuns gaúchos que tenho na biblioteca musical do meu computador, me vejo agora recorrendo a eles de maneira tão natural quanto começar o dia fazendo chimarrão (coisa que fazia no fim de semana e olhe lá). Estou verdadeiramente surpresa. De todo modo, minha alegria está em redescobrir álbuns e em reconhecer a beleza de alguns deles, que estão servindo de ótima companhia. Como eu não tenho mais o que fazer (literalmente até tenho, mas tempo não falta), resolvi vir até aqui, num blog nacional, extravasar um pouco do bairrismo e, quem sabe, ajudar outros gaúchos sós mundo afora, que precisam de companhia para matear e manter a sanidade quando a sensatez exige que fiquemos em casa. (A ordem é aleatória mesmo, sem a mínima lógica.)
De alma leve – Cesar Passarinho (1995)
Essa lista não poderia começar com outro artista. Sou uma fã reconhecida de Cesar Passarinho e ainda me pergunto como um artista da magnitude dele foi parar na minha cidade – aliás, pior, me pergunto como é possível que nenhum vivente tenha registrado em algum canto de Caxias do Sul, em letras garrafais, que o Passarinho escolheu essa cidade para viver. É absurdo. Ok, é uma cidade industrial e blablabla, mas já é hora de rever isso. Tudo bem, temos um festival com o nome dele, mas como tal festival não tem condições financeiras de ser realizado anualmente, o mínimo que poderíamos fazer é colocar o nome do Cesar Passarinho em uma praça, um centro de cultura ou até uma avenida. Aceito qualquer coisa, só exijo reconhecimento. Mas voltemos ao álbum, meu grande apego é “O homem, a alma e as águas”. Na minha opinião, a letra mais bonita cantada por Passarinho – e olha que esse cara escolhia muito bem as canções que interpretava, só letra fabulosa, e por isso mesmo ele é a melhor companhia de todas para qualquer gaúcho desgarrado.
Aqui – Almôndegas (1975)
Um dos grandes orgulhos da minha curta vida como professora primária é ter trabalhado “Canção da meia-noite” com meus alunos. Almôndegas foi uma das primeiras bandas a mesclar a cultura tradicional com a cultura popular gaúcha, fazendo um som único e agradável a todos os ouvidos. “Aqui” é o álbum perfeito para animar lentamente o dia, com todas as suas variações sonoras em perfeita harmonia. Basicamente, não tem tempo – muito menos humor – ruim com esse álbum rodando.
O mistério dos quintais – Quintal de Clorofila (1983)
Não tenho muita certeza de como esse álbum chegou nos meus acervos, mas o fato é que ontem o estava ouvindo e percebi a beleza inacreditável de cada letra. Até eu, que sou muito devagar quando o assunto é beleza poética, fui capaz de perceber – só agora, depois de ter ouvido esse disco outras tantas vezes, vai ver tava faltando solidão suficiente para concentrar nas palavras ditas. Inclusive, só agora fui pesquisar e descobrir que o álbum é resultado da parceria de irmãos de São Francisco de Paula, ali na Serra Gaúcha, e eu me pergunto como uma gurizada de uma cidadezinha que serve de refúgio conseguiu ser reconhecida a ponto de ter oportunidade de gravar um álbum. Provavelmente é porque a beleza das canções é óbvia demais para ser ignorada.
Longe demais das capitais – Engenheiros do Hawaii (1986)
Não sou uma grande fã e muito menos grande conhecedora da história dos Engenheiros, mas gosto particularmente desse álbum. Uma das razões para ser uma boa companhia para qualquer gaúcho desgarrado é o fato de ser uma banda reconhecida nacionalmente, então é fácil encontrar alguém que os conheça e com quem se possa dizer “vamos ouvir Engenheiros?” e assim se sentir menos solitário em qualquer meio onde a mania de dizer “capaz” precise ser explicada. O álbum tem grandes sucessos da banda, como “Toda forma de poder” e “Segurança”, que aliás abrem o disco, mas gosto especialmente das melodias de “Eu ligo pra você” e “Nada a ver” – até uma pessoa que não dança, como eu, acaba se balançando ao som das canções e, consequentemente, esquece que tá longe do que lhe é familiar.
Spermatozoon – Cidadão Quem (1998)
A bem da verdade, qualquer álbum da Cidadão Quem é uma boa companhia. Um dos grandes mistérios para os gaúchos é entender como a banda não alcançou reconhecimento nacional. Duca Leindecker, vocalista da banda, formou a dupla Pouca Vogal com Humberto Gessinger, o que faz um tanto sentido, já que os dois são letristas maravilhosos. O problema é que fora do sul o pessoal não conhece o Duca (agora, talvez, por ser marido da Manuela D’Avila – minha principal motivação para querer ela presidente, aliás, é ter o prazer de ver o Duca como Primeiro Cavalheiro) e acabam, automaticamente, dando créditos às boas letras gravadas pelo Pouca Vogal ao Humberto, mesmo sendo muitas delas sucessos consagrados da Cidadão Quem. Ou seja, fica a dica para os não-gaúchos que estão lendo esse post: conheçam Cidadão. Vale muito, muito a pena. É uma pena que a banda não exista mais.

Ouvindo um álbum e outro, perco as manhãs. Como agora. Encerro aqui, então, esperando que minhas companhias também ajudem vocês durante a pandemia. Cuidem-se.


Ana Seerig
Na Nossa Estante

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