Categories: Uncategorized

Lupita Gostava de Engomar [Resenha Literária]

O best-seller internacional de Laura Esquivel, Como Água para Chocolate, mergulhou no espirituoso conto de amor e família de uma mulher durante a Revolução Mexicana. Em seu mais recente livro, ela aborda a política de seu país de maneira muito mais aberta. Com sua descrição de como uma mulher problemática deve navegar por um labirinto de criminalidade, Lupita Gostava de Engomar faz uma análise sem censura do presente conturbado do México, no qual a corrupção e o crime abalaram a sociedade mexicana.
Neste livro, temos uma policial chamada Lupita, que começa a desmoronar depois de testemunhar um assassinato. Um político local chamado Doutor Larreaga teve sua garganta cortada em público na Cidade do México, a poucos metros de onde Lupita estava, embora “não houvesse evidência de alguém na vizinhança que tivesse algum tipo de faca ou lâmina”.
Com detalhes nítidos e fáceis de entender, além de uma linguagem rápida que reflete os pensamentos de Lupita, Esquivel nos mergulha na realidade de uma mulher à beira de um colapso nervoso. Em seu primeiro capítulo intenso, a autora estabelece um mistério a ser resolvido, mas também uma situação precária: Lupita manterá sua inteligência ou permitirá que seus demônios – alcoolismo e desprezo por suas próprias fraquezas – atrapalhem seus esforços para resolver o assassinato?

Lupita Gostava de tricotar e bordar. (…) quando conseguia se concentrar nos pontos, todos os pensamentos que atormentavam sua mente desapareciam.

Esquivel, que também é autora do romance Malinche, revela aspectos de Lupita até mesmo nos títulos dos capítulos, que são frases abruptas e declarativas como “Lupita gostava de se autocomiserar”, “Lupita gostava de dançar” e “Lupita gostava de deduzir”. Gradualmente, à medida que os detalhes do crime emergem, a policial reúne algumas pistas sobre si mesma: “Haviam duas Lupitas?” – “Uma Lupita sóbria e uma Lupita bêbada?”. Nesse caso, tinha que haver duas mentes: uma mente sã e uma mente demente que governavam suas respectivas personalidades. Seu comportamento fora de controle a leva a confrontar publicamente um narcotraficante altamente influente, uma ação que quase resulta em morte, e que trava batalhas que vão além do físico.
Esquivel tece referências ao antigo conhecimento e história asteca ao longo do livro, e começamos a perceber que a história de Lupita é na verdade uma alegoria: essa mulher de coração grande e potencialmente brilhante incorpora o México atual, um grande país que – pelo menos na visão da escritora – perdeu o seu caminho. (Até mesmo o nome de Lupita faz referência ao santo padroeiro do país, a Virgem de Guadalupe.) Cartéis de drogas, corrupção política e violência fizeram com que grande parte do potencial mexicano fosse desperdiçado, assim como o álcool e o trauma emocional assolaram Lupita.
Quando a policial passa por uma situação de crise, um xamã enigmático a leva para “uma comunidade indígena”. Esquivel agora revela outro aspecto da persona da policial: “Lupita gostava de semear”. Ela podia até ouvir a rachadura de uma semente no chão ao dar lugar a um novo broto. Seu amor pela agricultura e pela terra a auxiliam a se adaptar à sua nova comunidade, composta principalmente por mulheres, crianças e homens idosos. Diante de tanta violência relacionada às drogas, essas mulheres assumiram o controle, pois estavam cansadas de viver ansiosas.

Lupita Gostava de saber o porquê e o para quê das coisas. Conhecer as causas ocultas que impelia os indivíduos a agirem desta ou daquela maneira. O que mais a intrigava era saber por que as pessoas ficavam em silêncio diante das injustiças, dos abusos e da ilegalidade.

Os leitores podem ficar surpresos e até desconfortáveis ​​com a prescrição da comunidade para acabar com a terrível violência: Erradicar os malfeitores. Como uma mulher diz: cães mortos, não mordem.
No final, Lupita não embarca em uma fúria armada para vingar os inocentes do México. Ela, no entanto, dá um passo corajoso para levar à justiça um criminoso proeminente e bem relacionado. Com sua interpretação de Lupita, cultura indígena e mitologia antiga, Esquivel defende um renascimento mexicano que remonta à própria terra e ao orgulho e força do passado asteca. Perfurado pelo Sol é um apelo apaixonado por justiça e cura de uma das vozes mais notáveis ​​da América Latina.
Com uma edição sem falhas e que remonta a uma ambientação histórica impecável, Lupita Gostava de Engomar é um daqueles livros que te fazem refletir e entender um pouco de como a cultura no passado se formou, e como a política afeta um país inteiro. Uma leitura altamente recomendada para quem gosta de contexto histórico e situações que provocam inúmeros questionamentos.
FICHA TÉCNICA
Titulo: Lupita Gostava de Engomar
Autor: Laura Esquivel
Nota: 5/5
Onde Comprar: Amazon

Natália Silva

Na Nossa Estante

View Comments

Recent Posts

Um Lugar Silencioso: Dia Um [Crítica do Filme]

A duologia de terror misturada com elementos de ficção científica Um Lugar Silencioso do diretor…

2 dias ago

O Mundo de Sofia em Quadrinhos (Vol.1) [Crítica]

O mundo de Sofia é um clássico da literatura que eu não li e queria…

4 dias ago

Bridgerton – Terceira Temporada- Parte 2 [Crítica]

A segunda parte da terceira temporada de Bridgerton começou com muitas polêmicas! Eu li os…

5 dias ago

Do Fundo da Estante: Quinta-feira Violenta

O produtor, diretor e roteirista californiano Skip Woods fez em Quinta-Feira Violenta (Thursday no original)…

6 dias ago

Tudo O Que Você Podia Ser [Crítica do Filme]

Tudo o que você podia ser é dirigido por Ricardo Alves Jr. e não tem como…

1 semana ago

Sweet Tooth – 3ª Temporada [Crítica]

Sweet Tooth é um grande acerto da Netflix! Não só por escolherem adaptar as HQs…

2 semanas ago

Nós usamos cookies para melhorar a sua navegação!