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Cinemagia [Documentário]

Registro histórico de uma era praticamente em extinção, Cinemagia – A História das Videolocadoras de São Paulo nos traz ao mesmo tempo as curiosidades contadas pelos pioneiros no ramo e um painel nostálgico de uma época revolucionária, onde era possível assistir uma super produção cinematográfica sem depender da boa vontade dos canais de TV. Os depoimentos são ricos em detalhes, objetivos e não se conta um único diálogo desnecessário ou repetido, conseguindo emocionar até quem nunca assistiu um VHS na vida.
Desde o início das produções das fitas, passando pelas saudosas videolocadoras até o o seu inevitável fim com o surgimento das TVs à cabo e a pirataria, o diretor Alan Oliveira permite que seus entrevistados relatem suas experiências de maneira didática sem ser maçante, curiosamente diferentes entre si, porém todas claramente movidas pelo amor a Sétima Arte.
Alguns não conseguem conter a emoção e nós telespectadores voltamos no tempo e nos emocionamos também, porque nenhum clique no botão download de um torrent se compara ao gosto que era ir a uma videolocadora, escolher um filme, conhecer pessoas e discutir o que assistiu com o dono e os clientes. Se esses bons tempos não voltam mais, Cinemagia documentou tudo para que as futuras gerações possam ter o privilégio de saber como foram os primórdios do mercado de home vídeo e seus valentes personagens a quem nós temos muito o que agradecer.
E nosso muito obrigado a você também Alan Oliveira e à todos os envolvidos na produção. Esse post também é dedicado ao meu amigo Gilberto Petruche proprietário da Charada que resiste até hoje e a já extinta Dica Vídeo, onde frequentei durante a minha adolescência.
Abaixo minha entrevista com o diretor Alan Oliveira que nos atendeu gentilmente:
O Cinemagia é notadamente um projeto muito pessoal. Como você se descobriu cinéfilo, qual sua formação e como foi o período como frequentador das vídeolocadoras?
Sim, extremamente pessoal. Ele partiu da minha necessidade de expandir a experiência cinéfila dos dias de hoje, algo que fazíamos no passado com a ajuda das videolocadoras. Tenho 37 anos e sou formado como roteirista. A cinefilia sempre bateu forte em mim desde os meus 9 anos, quando tive a chance de ir ao cinema pela primeira vez.
As videolocadoras eram grandes atalhos entre a minha casa, na zona norte e as salas de cinema que ficavam no centro da cidade, então eu acabei passando muitas tardes visitando as lojas e tentando sentir o gosto dos filmes. Foi um período mágico, como vejo que também foi para muitos outros jovens da minha geração. Devo à elas a descoberta de grandes diretores e filmografias, de Hitchcock à Bergman, assim como ótimas amizades que foram concebidas dentro desses maravilhosos espaços.
Quais foram as dificuldades enfrentadas pela Lumolab na produção do Cinemagia?
Eu já vinha pensando em trabalhar com o tema “memória” há algum tempo. É um tema difícil para um país que não costuma dar valor à sua própria memória e seus legados. Eu sempre quis saber o que aconteceu com essas pessoas que tiveram (e ainda tem) esse modelo de negócio, sempre quis entender o que os levou a resistir à tantas transformações tecnológicas. Foram inúmeras dificuldades em 4 anos de trabalho, óbvias de um projeto independente: equipe, orçamento, produção…mas a maior dificuldade foi fazer as pessoas entenderem que eu não queria abordar esse assunto falando sobre o fim de uma era. Ao contrário, eu sempre quis celebrar esse período, as conquistas, o saldo positivo da experiência. Mas quando eu dizia isso ninguém dava bola. Achavam que não seria relevante. As pessoas queriam saber do trágico, da guerra das lojas com a pirataria e com a internet.
Mas isso não tem nada ver com magia que vivemos nas lojas, jamais seria o tema do filme.
Ao meu ver, só existe um caminho sadio para que nós, clientes de videolocadoras, tenhamos a chance de compreender o que aconteceu de verdade: deixar que os protagonistas dessa história falassem. E eles falaram. Disseram tudo.
Daí começou o meu trabalho de pesquisa e de ir ao encontro desses protagonistas, que durou mais de três anos. Muitos estavam escondidos e negaram nosso pedido, com medo dessa abordagem trágica. Alguns nos deixaram esperando por mais de um ano. Por fim, todos concordaram e entenderam que o filme “CineMagia” nada mais é do que uma grande reunião desses profissionais, uma chance única de retratar no cinema (elemento chave de seus esforços) o que eles fizeram para construir o home video brasileiro.
Primeiro veio a TV, depois o home vídeo, as TVs à cabo, atualmente o download ilegal de filmes e mesmo assim o cinema sobrevive. Como você vê o futuro da Sétima Arte?

Não gosto de previsões. Não acho prudente se apoiar em futuras ideias num cotidiano tão movido a tecnologia como o nosso. A tecnologia muda tudo, sempre mudou. É apenas isso que precisamos saber. Em toda evolução perdemos alguma coisa e ganhamos outra. O que sabemos é que a forma de ver filme (em casa e nos cinemas) vai mudar constantemente, para muitos caminhos. Sempre visando o que for mais cômodo, deixando a experiência desses acessos menos sensorial, menos humana. É disso que tratamos no “CineMagia”, sobre um hábito que se perdeu com todas essas evoluções, mudando o contato que temos com os filmes.
O Cinemagia é um registro inédito de uma época que nós adultos vivemos e lembramos com muito carinho. No entanto ninguém teve a mesma ideia que você. Houve alguma interferência externa na realização do documentário?

Este é, para muitos, um tema árido, como bem disse um dos nossos depoentes. Nós mostramos que não é. Pra mim nunca foi. Gosto de pensar que o tema me escolheu, que é a minha chance de dizer obrigado à tantas pessoas que facilitaram meu acesso e de tantas pessoas aos filmes que fazem parte da nossa formação cultural. “CineMagia” é meu primeiro longa, depois de anos produzindo e dirigindo curtas-metragens e projetos para as redes sociais. Isso incomodou muita gente. Mas a magia segue fluindo através do filme, achando seu espaço para perpetuar essa história. E é isso o que importa.
Você extraiu dos entrevistados depoimentos ricos e ao mesmo tempo descontraídos e dinâmicos. Como você conseguiu essa proeza aparentemente tão difícil?

Foram mais de 55 gravações. A cada uma delas, uma enorme euforia invadia meu peito, me fazendo entender que era uma chance única de conhecer os protagonistas dessa história, os responsáveis pelo lançamento de tantos títulos que fizeram a minha infância e adolescência serem mais doce e feliz, como “Indiana Jones”, “E.T”, “Labirinto: a magia do tempo” e até o clássico de terror, “A morte do demônio”. Eu não cheguei aos depoentes como um diretor de cinema, mas sim como um cliente de videolocadora, como um cinéfilo.
A identificação foi imediata. A magia então, que estava na U.T.I, voltou a vida e invadiu o circuito, fazendo a engrenagem andar. Tudo fluiu naturalmente, como um bom bate-papo, como se tivessem que acontecer.
Você pode nos contar com exclusividade qual o próximo projeto da Lumolab?

“CineMagia” ainda vai ocupar uma boa parte do nosso calendário de 2018, já que é um projeto transmídia: teremos uma série de TV sobre o tema e o lançamento do livro, que conta como foi juntar as peças desse quebra-cabeça. Depois disso devo seguir com um projeto de um novo longa de ficção, ainda sem data de produção.
Bate Bola
– Um filme: Morangos Silvestres
Um diretor: Alfred Hitchcock
Um ator e uma atriz: Gary Grant e Julianne Moore
Qual roteiro gostaria de ter filmado: Não gostaria de ter filmado, talvez apenas participado das produções. Roteiros como de Gênio indomável e Brilho eterno e uma mente sem lembranças são, ao meu ver, geniais.

Trailer:

FICHA TÉCNICA
Título: Cinemagia
Direção: Allan Oliveira
Nota: 5/5
Italo Morelli
Na Nossa Estante

View Comments

  • Olá!
    Que nostalgia gostosa. Lembrei das minhas idas e vindas a videolocadora que tinha aqui pertinho de casa. (Todo final de semana). Ainda tenho um VHS do filme Titanic que assisti milhares de vezes. (risos). Obrigada por esse momento!
    Bjos

    http://www.momentosdeleitura.com

  • Oiê! Tudo bem? Que saudade dessa época! Rebobinar a fita, devolver na segunda-feira sem falta para não pagar multa e ainda chegar lá e falar com a pessoa da locadora e com o outro cliente que foi lá devolver ou pegar novos filmes. Hoje é tudo digital, tudo virtual, nada se compara com a sensação de andar pelos corredores para escolher o filme que será assistido por no mínimo toda a família ou amigos. Mesmo na época do DVD, antes da pirataria, a sensação não existe mais. Uma pena.
    Ótimo post. Vou procurar para assistir depois.
    Beijos

  • Ei! Que legal esse post! Conheço muito bem essa nostalgia, porque era cliente de uma locadora na infância e adolescência. Meu pai era cliente, e depois foram os filhos, a pegarem 2, 3 filmes no fim de semana pra devolver na segunda.. Me achava o máximo, com a sacolinha da locadora, toda sexta.. Realmente foi uma pena terem se acabado quase que totalmente, acho que os garotos de hoje não sabem nem o que é um videocassete..
    Bjox

  • Só vai ficar na saudades, hoje existe apenas uma locadora em pé no centro de São Paulo a Vídeo Connection com um acervo enorme de DVD, BLUE RAY e VHS e ninguém nem se interessa, acredito que é uma questão de tempo para também deixar de existir.

  • Caramba! Que legal! Saudades de ir a locadora todo final de semana de manhã bem cedinho pra conseguir pegar os melhores filmes antes dos outros!! rs
    Não conhecia esse documentário mas fiquei bem curiosa. Adorei a entrevista!!

    beijinhos!!

    #Ana Souza
    https://literakaos.wordpress.com

  • Grande UNKNOWN, existe mais uma a Video Locadora Charada.
    em Sapopemba Zona Leste.
    Blu Ray, DVD, e VHS.

  • Oi, Italo.
    Me lembro com muito carinho das idas à locadora perto de casa para escolher filmes para ver no final de semana e vejo que a modernidade acabou com muitos prazeres simples que tínhamos no dia-a-dia. Vou procurar pelo documentário.
    beijos
    Camis - blog Leitora Compulsiva

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