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Eu, Tonya [Resenha do Filme]


Tonya Harding foi a primeira mulher patinadora a dar o primeiro Salto Triplo Axel em competições, disputou por duas vezes os Jogos Olímpicos, foi campeã do campeonato nacional americano e conquistou a medalha de prata no Campeonato Mundial de 1991. Infelizmente, Tonya não é somente conhecida como uma atleta vencedora, mas principalmente pelo incidente que lesionou o joelho da patinadora Nancy Kerrigan, nas sessões de treinamentos durante o Campeonato dos Estados Unidos em 1994. Sem dúvida, um dos casos mais bizarros do esporte.
Como qualquer filme baseado em fatos reais, nem tudo é tão real assim, até hoje não se sabe ao certo até que ponto Tonya estava envolvida no ataque, mas a personagem da excelente Margot Robbie é pintada muito mais como vítima do que como a vilã conhecida pelos americanos. Depois das Olimpíadas em 1994, Tonya foi impedida de patinar oficialmente para sempre e no longa fica bem claro que isso abalou bastante sua vida. Aliás, ainda que seja uma história internacionalmente conhecida, Eu, Tonya bem que guarda algumas surpresas, já que a história de vida da protagonista por si só já é um excelente enredo.
O filme é narrado pelos próprios personagens como um documentário em que cada um comenta seu ponto de vista dos acontecimentos. Dessa forma, vamos entendendo a personalidade de Tonya (Margot Robbie) e sua vida conturbada que começa aos 3 anos de idade quando sua mãe obriga a treinadora Diane Rawlinson (Julianne Nicholson) a aceitá-la, mesmo tão jovem. A partir de então, o mundo da protagonista gira em torno da patinação, uma vida marcada pelo abandono do pai, uma mãe abusiva e um marido violento. Por diversas vezes no filme Tonya diz que as coisas que acontecem com ela não é sua culpa, e de fato muitas vezes não é mesmo, já que é clara a sua dificuldade em sair do ciclo do abuso. E ainda que a narrativa use do sarcasmo para dar um tom de comédia, algumas cenas são bem fortes, marcantes e indigestas.
O recuso de fazer os atores conversarem com a câmera faz com que a narrativa seja irônica, por vezes se dizem inocentes quando as ações em tela mostram exatamente o contrário. A acidez da mãe de Tonya, LaVona Golden (Allison Janney) e o modo de tratar a filha gera riso, mas também causa um imenso desconforto, mesmo porque ela acreditava que fazer a filha se sentir um lixo a ajudava nas competições, sem contar todas as vezes que bateu em Tonya. E justamente por isso que, em partes, acredito que a protagonista viu em Jeff (Sebastian Stan) uma forma de fugir dos abusos da mãe, o problema é que ela só saiu de um relacionamento violento para entrar em outro. É marcante a cena em que Tonya diz que sua mãe a amava, mas batia nela, então acreditava que o mesmo acontecia com Jeff.
Tonya tenta escapar do seu casamento algumas vezes. Ousada e com uma personalidade forte, a protagonista enfrentava os juízes, questionava sua notas, brigava com sua técnica, que foi responsável por dar uma segunda chance a ela e descobriu, da pior forma possível, os preconceitos na patinação no gelo, que iam do julgamento das roupas até na implicação dos valores tradicionais americanos.
E como se não bastasse um mãe abusiva, um marido violento, ainda temos a figura de Shawn (Paul Walter Hauser), um claro sociopata, que junto de Jeff transformam um plano idiota em algo bem mais grave. Ou seja, Tonya não teve boas companhia na vida e a violência foi algo constante em sua carreira. Na verdade é admirável que com tantos problemas pessoais, a atleta ainda tenha conseguido tantas vitórias.

Margot Robbie está incrível no papel principal, a cena dela se maquiando antes das Olimpíadas, chorando e tentando sorrir é de arrancar lágrimas e Allison Janney mereceu o Globo de Ouro de atriz coadjuvante, sem dúvida, uma grande vilã, mas que de alguma forma consegue ter carisma. A ambientação, figurino e direção estão ótimos, o longa é bem dinâmico e o recurso narrativo de documentário deixa a história bem real, mas peca pelos efeitos visuais, já que é possível ver que não é a Robbie que está executando as coreografias no gelo e a atriz não consegue se passar por uma jovem de 15 anos em determinado momento do filme. No entanto, nada disso chega a ser um incômodo.
Eu, Tonya é forte, impactante, é muito mais do que uma história sobre um incidente na patinação, é também uma história sobre abuso, violência, superação e machismo, afinal, o longa nos mostra bem como a mídia e a sociedade conseguem transformar mulheres destemidas e impetuosas em vilãs e mulheres dóceis em princesas vítimas.
Jamais saberemos se Tonya foi mesmo uma grande vilã, ainda que a história real mostre indícios de sua participação no incidente, mas é bem interessante ver o ponto de vista dos diversos personagens e como a atleta foi mais uma de muitas mulheres marcadas pelo ciclo do abuso.

Trailer:
FICHA TÉCNICA
Título: Eu, Tonya
Título: I, Tonya
Diretor: Craig Gillespie
Data de Lançamento no Brasil: 15 de Fevereiro de 2018
Nota: 4,5/5

*conferimos o filme na cabine de imprensa


Michele Lima

Na Nossa Estante

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