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Belas Adormecidas [Resenha Literária]

Antes de começar a falar de Belas Adormecidas, preciso fazer uma importante consideração. Umas das coisas que mais me chamou atenção quando fui pesquisar sobre o livro de Stephen King escrito em parceria com seu filho Owen King, foi a quantidade de páginas e de pessoas reclamando delas, dizendo que o livro poderia ser menor. De fato, ao ler a obra, posso afirmar que poderia mesmo, mas que com certeza perderia em qualidade. Isso porque Belas Adormecidas não é um conto ou uma novela simples, é um romance com todas as características que possuem o gênero. Temos várias ações paralelas e personagens que podem surgir no início ou no meio da história e desaparecerem depois de cumprir sua função e tudo que acontece serve de apoio para o desenvolvimento dos personagens principais e a ambientação da obra.
No entanto, na atual sociedade fast food em que tudo é muito rápido e mastigado porque as pessoas não querem perder tempo lendo ou refletindo, obras mais complexas como essa acabam sendo criticadas pelo tamanho. Uma pena, porque Belas Adormecidas é um dos livros com mais camadas de profundidade que li nos últimos tempos. Fico pensando o que seria do meu amado Dom Quixote e suas mais de mil páginas nos tempos de hoje, com certeza não serviria nem de prendedor de porta e perderíamos tanto sem ele. Aliás, vale ressaltar que quantidade de páginas pode até influenciar negativamente a leitura, se a história não nos interessa muito, ou é ruim, o que não é o caso, longe disso.
Feita minha consideração, vamos ao livro de Stephen e Owen King. Um dia uma misteriosa árvore aparece em Dooling, uma misteriosa mulher aparece na cidade também e uma onda de sono atinge mulheres no mundo inteiro. A onda Aurora faz com que as mulheres ao dormirem criem uma espécie de casulo assim como as mariposas e se tentarem abri-lo, elas atacam ferozmente. Obviamente, em determinado momento do livro um homem tem a brilhante ideia de abrir o casulo para estuprar uma mulher adormecida e as consequências são terríveis, para ele.
Os homens ficam desesperado pelo mundo, todos sem saber o que fazer, alguns atacam os casulos com fogo, outros culpam as mulheres, afinal, a culpa é sempre nossa, e a maioria usa o medo como arma de expor seu machismo e agressividade, mas não todos. Dr Clint Norcross, 48 anos, psiquiatra no Instituto penal para Mulheres, consegue manter a razão e é a peça chave na trama e em conjunto com a misteriosa Evie (ou Eva ou ainda Eve) Black tentam salvar as Adormecidas.
Acredito que pelo nome Eva já dá pra imaginar que a personagem tem várias referências bíblicas e é sem dúvida um dos grandes mistérios da obra. Evie sabe de tudo e de todos, presenciou eventos históricos, fala com os animais e consegue ver o que acontece no mundo em que as Adormecidas estão. Seu mistério chama atenção do personagem Frank, agente do controle de animais, um pai protetor e agressivo que quer a qualquer custo entrar na prisão onde Evie está e fazer com que ela acorde sua filha. No entanto, a personagem sabe que Frank irá perder a cabeça, que vai torturá-la junto com os outros homens e por fim matá-la, acabando assim com a possibilidade de trazer as mulheres de volta. Evie sabe que a razão não terá voz, apenas a violência. Para sobreviver e ajudar as Adormecidas, ela conta com a ajuda de Clint Norcross, que junto com alguns guardas da prisão, uma jornalista e seu filho Jared, tenta proteger o lugar de uma invasão.
A obra começa um pouco antes das mulheres adormecerem e assim podemos entender melhor alguns dos personagens mais importantes da história, temos o guarda Don, assassino e abusador, responsável por uma das cenas mais fortes de abuso sexual com a detenta Jeanette, uma das minhas personagens preferidas. Uma mulher sincera, persistente e carismática ainda com todos os erros do seu passado. Temos também a controversa Lila, a personagem que mais irritou no livro. Xerife, casada com Clint, Lila acredita que seu marido teve uma filha fora do casamento e ainda o chama de autoritário e reclama constantemente de seu isolamento, já que o psiquiatra não fala muito sobre seus sentimentos. Entretanto, o que eu vi na história foi um homem bom, generoso, honesto e com problemas de comunicação com a esposa. Do meu ponto de vista, Lila é condescendente com a falta de comunicação no casamento e se faz de vítima da situação para culpar o marido. Apesar de ser uma das personagens mais girl power do livro, foi a que mais me incomodou, principalmente na reta final.
Destaque também para Jared, o filho de Lila e Clint, um garoto apaixonado e bondoso e Angel, a detenta psicopata que comete coisas horríveis no passado, mas ao ficar na cela com Evie acaba tendo diálogos engraçadíssimos que funcionam como alívio cômico. Angel representa o pior da humanidade, mas até mesmo ela tem sua camada de profundidade e se torna uma das personagens principais da história no final do livro.
Stephen King e Owen King trabalham com diversos temas: sistema carcerário, racismo, machismo, feminino, sexismo e violência doméstica. O estereótipo com certeza é o ponto que chama atenção na obra, mas para mim não resta dúvidas de que a intenção dos autores foi justamente essa, nos chamar atenção para os rótulos. Se no começo tudo parece muito claro, homens maus e mulheres boas, ao longo da narrativa os Kings vão quebrando os estereótipos, nos mostrando o lado bom e ruim de quase todos os personagens. Clint começa a história parecendo um homem bobo e tranquilo demais, Frank um homem bom e protetor da filha, Lila uma mulher forte e decidida, Jeanette apenas uma vítima. No entanto, ao aprofundar seus personagens os autores nos mostram que todos nós erramos e acertamos na vida.
Os homens transformam a vida sem as mulheres num caos apocalíptico e talvez este seja o ponto que os leitores masculinos possam reclamar, já que ao colocarmos na balança, Belas Adormecidas de fato pende para o lado feminista. Algo que, particularmente, me agrada bastante, afinal, são tantas obras machistas neste mundo, um pouco de empatia pelas mulheres na literatura não faz mal a ninguém, a não ser ao orgulho machista. Porém, não vamos colocar rótulos numa obra tão complexa, sugiro uma leitura mais atenta, certamente encontramos profundidade em personagens masculinos e femininos.
Belas Adormecidas é um livro que mistura o sobrenatural com histórias bem reais, é denso, com momentos mais leves e outros bem pesados e violentos, mas a narrativa de Stephen e Owen King é fácil, fluida e eles sabem contar uma boa história, tanto que acabei lendo muito mais rápido do que imaginava! É impossível não querer saber o que vai acontecer com as mulheres que estão dormindo, com Evie, as mariposas e tudo caminha para um clímax que fiquei presa na história e agora sinto falta dela. E apesar das longas páginas, tudo serve de alguma forma para montar a história e nos fazer entender o que se passa no enredo. Uma das melhores leituras dos últimos anos, daquelas que a gente fica remoendo por dias, e espero que façam um boa adaptação logo!
FICHA TÉCNICA

Título: Belas Adormecidas
Autores: Stephen King e Owen King
Onde Comprar: Amazon

Michele Lima

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