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Peter Pan [Resenha Literária]

Peter Pan foi escrito por J.M Barrie em 1953, sendo uma obra clássica que já havia lido quando adolescente e tive a oportunidade e reler agora na nova edição da Martin Claret.
Lembro que uma das coisas que mais me chamou atenção era que Peter não era exatamente um herói, às vezes nem mesmo simpático. Totalmente ao contrário da figura que eu tanto amava dos desenhos animados e que me fazia deixar a janela do quarto aberta, na esperança de que ele aparecesse. Peter é uma criança que não cresceu, que gosta de viver aventuras, que tem uma memória terrível, é irresponsável, egocêntrico e carente.
Oras Peter Pan me suscitava pena por viver em sua bolha (a Terra do Nunca), sem ter pais, usando a agressividade como uma forma de reprimir sua carência, oras me suscitava simpatia justamente por conseguir viver na sua bolha, sem encarar as responsabilidades, oras antipatia por sempre pensar em si mesmo e querer ser o centro das atenções, mesmo que isso pudesse fazer mal a outra pessoa e por fim, incredulidade, nunca vi uma criança ter tanta falta de memória! Aliás, o esquecimento é um ponto importante nessa história. Peter parecer sofrer no final, mas esquece da semana da faxina, se esquece de quem matou, bem como o narrador parece não se importar de se lembrar também dos mortos.
E falando do narrador, o livro é narrado em terceira pessoa por alguém que não só conhece a história, como conversa com o leitor constantemente, antecipando os fatos ou atiçando nossa curiosidade.
A capacidade de Peter de não se preocupar pelos problemas que arruma sempre me deixou bastante inquieta, mesmo porque o protagonista não é um personagem raso, aliás, ninguém na obra é, a começar pela Sra. Darling, descrita como uma mulher doce, mãe amável, mas que nem o Napoleão conseguiria tirar um beijo dela. Também, temos o Sr. Darling, um homem que teve que fazer muitas contas pra saber se conseguiria criar os filhos.
Wendy é a menina-mãe e a figura da irmã responsável que se remete a mãe do autor, J. M Barrie, Margareth, que depois de órfã assumiu o papel de mãe do irmão caçula. E vale lembrar que na obra Margareth é o nome da neta de Wendy.
É interessante notar que Peter leva Wendy para a Terra do Nunca para ser mãe dele, o que me faz lembrar que muitos homens agem assim com suas esposas. Entretanto, assim como a Sra. Darling, a filha é bastante perspicaz, inclusive para tomar iniciativa sempre no que diz respeito a Peter Pan. Claro que estamos falando de um romance leve, ingênuo, afinal, são crianças.
Já a Sininho representa outro arquétipo de mulher, diferente de Wendy, com seu amor leal e quase cego. A fadinha é independente, é forte, não precisa ser protegida, mas está constantemente tentando agradar a Peter Pan, nem que para isso ela tenha que ser a vilã. Ao contrário de Wendy, que é mais frágil, sem nenhum poder, mas não deixa que Peter atrapalhe suas opiniões e valores.
Pra quem não conhece a clássica história, Wendy, João e Miguel são levados a Terra do Nunca, Wendy para ser mãe dos meninos perdidos e os dois irmãos acabam entrando nessa aventura. Temos piratas, índios, fadas e sereias que nos dão medo. Uma obra repleta de aventuras em que o faz de conta reina no universo criado pelo autor.
Além de toda a questão de lidar com o crescimento e fase adulta, temos também toda a ambiguidade entre os beijos de Wendy, o desejo de Peter em ter uma mãe e o simbolismo da sua luta com Capitão Gancho que nas peças de teatro tradicionalmente é protagonizado pelo mesmo ator que faz o pai de Wendy, uma vez que o Sr. Draling é a representação da fase adulta e toda sua amargura também.
Todo o universo criado pelo autor é de um realismo fantástico incrível. Não só a Terra do Nunca que sabiamente é descrita de maneiras diferentes na imaginação das crianças, mas que não deixa em nada a desejar quando eles a encontram de fato. A Londres de Barrie também é fantástica, é um lugar em que cadelas são babás e que as mães organizam os pensamentos dos filhos enquanto eles dormem.
J.M. Barrie constrói uma narrativa repleta de aventuras, mas com analogias bem interessantes. Crianças podem ser fofas, mas também podem ser cruéis, principalmente se vivem sem nenhum tipo de orientação familiar e o autor explora bastante esse tema na figura de Peter Pan, que se recusa a crescer não importa o quanto maravilhosa possa ser sua mãe.
E para quem acha que estamos lidando com mais uma simples edição de Peter Pan, não se enganem, a obra está belíssima, com ilustrações coloridas de Weberson Santiago, com tons que combinam com as aventuras narradas e notas de rodapé com informações que nos levam além do clássico.
Poderia dizer que é uma edição para colecionadores, fãs da obra, como eu, mas a verdade é que a edição também pode ser trabalhada em sala de aula, já que os apêndices de notas da Luciana Duenha Dimitrov sugerem reflexões que poderiam ser usadas por professores, pais ou até mesmo por nós simples leitores, já que Peter Pan sem dúvida é um livro para se divertir e refletir não importa a idade.
FICHA TÉCNICA
Título: Peter Pan
Autor: J.M. Barrie
Onde Comprar: Amazon
Michele Lima
Na Nossa Estante

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